O Yoga deve ser atualizado?
Nosso tempo pós-moderno que se caracteriza por valorizar a individualidade, massificar o consumo e fortalecer uma visão relativista dos fatos afeta nosso cotidiano e sistema de crenças. O Yoga não pode escapar de tais influências, adaptando sua linguagem e propósitos às demandas da sociedade.
Nas questões corporais notamos o crescimento das atividades do “fitness”, que transformam o corpo em um produto a ser conquistado e exibido, mais do que sentido. Nas tradições do Yoga este corpo nunca foi um fim, mas um caminho para autoconhecimento e transformação. Neste contexto será que não estamos também idealizando o corpo yogi?
Muito conhecimento foi “intuído” pelos yogis ao longo dos tempos. Esta somatória de sabedoria foi contribuindo para a origem dos diversos métodos de Yoga. É muito recente a troca de conhecimentos entre a tradição do Yoga e as pesquisas científicas. O Yoga tem propósitos além dos efeitos sobre o “corpo físico”. O corpo é um veículo para a jornada de Annamayakosha (corpo físico) para Anandamayakosha (corpo de bem aventurança). Minha questão é compreender o quanto nesse processo as técnicas de yoga, me refiro principalmente as posturas (ásanas), estão de acordo com os modelos científicos que explicam o funcionamento do corpo. E a hipótese é que quanto mais as técnicas de yoga se chocam com o que fisiologia propõe como saudável mais nos afastamos também da meta final do yoga. É possível fazer essa jornada respeitando o que as ciências básicas ensinam sobre fisiologia?
A pergunta final é: tudo que experimentamos e sentimos com o Yoga nos faz crer que o Yoga fará o mesmo aos nossos semelhantes, mas temos uma explicação?
Sei que a meta do Yoga não deve ser confundida com os benefícios, mas porque a meta do Yoga transcende seus efeitos temos o direito de negar ou deixar em segundo plano um olhar objetivo e científico sobre tais efeitos nos sistemas que constituem toda a complexidade do ser humano?
Acho que o caminho natural é não fechar as portas a uma maior integração entre os diversos campos de conhecimento. Muito ainda há de ser feito, pois vejo que há um desinteresse mútuo entre as áreas; poucas pesquisas são feitas sobre Yoga e poucos Yogis sentem necessidades de uma melhor compreensão sobre seus métodos.
Segue então um pequeno resumo sobre informações colhidas de pesquisas recentes (na área das ciências do movimento) que acredito que possam trazer contribuições às práticas. Espero também que estes dados contribuam com idéias e questionamentos trazendo luz sobre investigações que possam ser feitas no futuro. Muito ainda está para ser feito nesta área, e também nos campos do comportamento humano, da cognição e das emoções e sua relação com o Yoga.
Evidências sobre Yoga
Aspectos positivos:
Método que integra
O Hatha Yoga trabalha com os conceitos “mente/corpo” de forma integrada, como uma unidade. Nos ensina a observar e sentir o corpo – o que alonga, o que sustenta, como respiramos, etc. Definitivamente nos ajuda a aumentar a consciência corporal e de nosso estados internos.
Em uma sociedade sedentária e que separa “corpo” e “mente” em entidades diferentes é muito raro encontrar pessoas verdadeiramente em contato consigo mesmas, com seus corpos e sentimentos.
Alívio ao Stress
Nossa sociedade além de sedentária é estressada. O Yoga e suas escolas constituem ferramentas muito eficientes para combater os excessos do Stress. Há algo terapêutico em se observar, alongar, alinhar, respirar e se exercitar. Uma aula que foque em correto movimento, correto alinhamento e um progressivo relaxamento ao final pode melhorar nossa saúde e nos fazer lidar melhor com as demandas da vida.
Equilíbrio
Ao propor Asanas que modificam nossos pontos de apoio no solo demandam o equilíbrio de longas alavancas do corpo estamos desafiando o sistema proprioceptivo e trabalhando nosso equilíbrio.
As solas dos pés são ótimos e importantes proprioceptores, estimulados quando praticamos descalços. Propriocepção e equilíbrio são extremamente importantes à qualidade de nossos movimentos na vida diária.
Aspectos negativos
Falta de atenção às demandas individuais
Nossas mães sempre acham que somos especiais e únicos, mas nas aulas é raro encontrar uma proposta individualizada. Até existe uma divisão entre iniciantes e avançados, mas tal divisão refere-se mais à habilidade do praticante do que aos padrões individuais. Cada indivíduo possui padrões de movimentos próprios e isso deveria ser considerado em uma aula.
Instabilidade
É preciso lembrar que flexibilidade e mobilidade são diferentes. Flexibilidade refere-se à amplitude de movimento total (passiva) e mobilidade considera a amplitude com o movimento voluntário (ativa). Praticantes assíduos de aulas de Yoga tendem a apresentar instabilidade em algumas articulações, especialmente coluna lombar (mais flexibilidade do que mobilidade – ou mais amplitude do que controle). As pesquisas recentes sobre a coluna lombar tendem a considerá-la uma área de passagem de força, que conecta o tronco aos membros inferiores. Em outras palavras deveríamos trabalhar para a estabilidade da lombar e da pelve e não para a flexibilidade.
Soluções
Procure um instrutor que tenha se preparado, que possua algum tipo de formação de boa qualidade sobre a técnica que ensina. Além disso o professor deve adquirir conhecimentos sobre o funcionamento de corpo humano e sobre biomecânica.
Hoje muitos cursos de formação para professores de Yoga incluem aulas sobre as ciências básicas do corpo e do movimento.
Teste algumas aulas (1 mês pelo menos) para avaliar a competência do professor. Se boa parte da aula for baseada em inclinar, flexionar, torcer ou estender a coluna é melhor procurar outra aula.
Procure turmas menores nos primeiros meses de prática, assim suas chances de um olhar individualizado aumentam. Também procure conhecer melhor sua condição física.
Prioriza a qualidade e não a quantidade. Este princípio serve para tudo na vida e não é diferente no Yoga. Ao praticar busque entender de onde vêm os movimentos e as sensações do corpo. Procure se informar se estão acontecendo nos segmentos adequados do corpo, mobilizando o que deve ser mobilizado e estabilizando o que deve ser estabilizado. Isso sim é terapêutico e nos conduz a um equilíbrio entre nossos corpos e emoções.
Entendo que o Yoga represente uma tradição muito antiga, mas podemos respeitar o patrimônio cultural do Yoga, seu propósito original, e ao mesmo tempo promover uma integração cada vez maior com as ciências relacionadas ao movimento.
Espero que este pequeno texto nos ajude a experimentar e viver de forma mais livre o melhor Yoga que pudermos.
Namaste!
Pedro Bara Zanotto é Bacharel em Esporte pela USP, professor de Yoga certificado em Iyengar e está aprendendo a se equilibrar nas ondas.
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